E a partir daqui começo a escrever em português, não vá parecer uma conferência do Zeinal Bava nos anos dourados, antes de se perceber que o homem afinal percebia tanto de gestão, como eu de passar camisas a ferro.
No Domingo, a convite de uns colegas/amigos - e depois de um jantar de sushi, no qual testei os limites de armazenamento do meu estômago - fui visitar o keukenhof garden.
Quando me falaram que o plano era ir de bicicleta e voltar, subitamente descobri um enorme interesse por tulipas, que deveria andar adormecido até à data :)
Aluguei a bicicleta mais barata que encontrei. Single-speed, travão de contra-pedal, chiava um bocado a cada pedalada... resumindo, era PERFEITA!
Isto depois de anos a andar em bicicletas de carbono afinadas que nem relógios suíços, sabe bem voltar ao básico.
Toda a gente foi pontual (é incrível como toda a gente é pontual), e arrancamos à hora marcada.
A viagem foi agradável. Bom tempo, sol a espreitar, paisagens agradáveis... O facto do terreno ser plano permite ter uma visão mais extensa de onde estamos e para onde vamos. É um país muito bonito fora das zonas citadinas, e para se ir descobrindo aos poucos.
Eu lá ia qual miúdo de 5 anos em cima da minha bicicleta que chiava... vento na cara, a explorar uma cidade nova, um país novo, paisagens novas. O tal sentimento que já me fez embarcar em tantas aventuras por aí.
Depois de cerca de 2horas chegamos ao destino. Almoçamos. Fizemos a visita ao jardim, tiramos umas fotos, umas brincadeiras... A companhia foi muito agradável. Gente simpática, descontraída. divertida.
Depois de vermos tulipas de todos os tamanhos, feitios e cores - para além de outros elementos de interesse que existem no parque - era hora de voltar.
Entretanto o sol foi descendo devagar, reflectindo na agua, fazendo com que o background da nossa viagem fosse ainda mais bonito.
O cansaço de um longo dia ia-se apoderando dos nossos corpos, mas toda a gente tinha a expressão de um sorriso desenhado no rosto.
Cheguei a casa as 9 da noite, depois de um longo dia. E que grande dia.
Beijos e abaços
hoje escutei este poema para assinalar a morte do poeta...
ReplyDeleteBicicleta
Lá vai a bicicleta do poeta em direcção
ao símbolo, por um dia de verão
exemplar. De pulmões às costas e bico
no ar, o poeta pernalta dá à pata
nos pedais. Uma grande memória, os sinais
dos dias sobrenaturais e a história
secreta da bicicleta. O símbolo é simples.
Os êmbolos do coração ao ritmo dos pedais –
lá vai o poeta em direcção aos seus
sinais. Dá à pata
como os outros animais.
O sol é branco, as flores legítimas, o amor
confuso. A vida é para sempre tenebrosa.
Entre as rimas e o suor, aparece e desaparece
uma rosa. No dia de verão,
violenta, a fantasia esquece. Entre
o nascimento e a morte, o movimento da rosa floresce
sabiamente. E a bicicleta ultrapassa
o milagre. O poeta aperta o volante e derrapa
no instante da graça.
De pulmões às costas, a vida é para sempre
tenebrosa. A pata do poeta
mal ousa pedalar. No meio do ar
distrai-se a flor perdida. A vida é curta.
Puta de vida subdesenvolvida.
O bico do poeta corre os pontos cardeais.
O sol é branco, o campo plano, a morte
certa. Não há sombra de sinais.
E o poeta dá à pata como os outros animais.
Se a noite cai agora sobre a rosa passada,
e o dia de verão se recolhe
ao seu nada, e a única direcção é a própria noite
achada? De pulmões às costas, a vida
é tenebrosa. Morte é transfiguração,
pela imagem de uma rosa. E o poeta pernalta
de rosa interior dá à pata nos pedais
da confusão do amor.
Pela noite secreta dos caminhos iguais,
O poeta dá à pata como os outros animais.
Se o sul é para trás e o norte é para o lado,
é para sempre a morte.
Agarrado ao volante e pulmões às costas
como um pneu furado,
o poeta pedala o coração transfigurado.
Na memória mais antiga a direcção da morte
é a mesma do amor. E o poeta,
afinal mais mortal do que os outros animais,
dá à pata nos pedais para um verão interior.
Herberto Hélder (1930-2015)
Adoro o poema, Não conhecia Ana.
DeleteObrigado :)